reflexos de vida no silêncio espelhado da água. fragas de vidro em descontinuidades do olhar ...

sexta-feira, maio 04, 2007


Quem o vê engraça logo com ele. Oito anos bem comprimidos num corpinho sem defeito p'ra botar. Em noites de festa, veste a rigor o fato de campino que lhe assenta como em figurino de medidas perfeitas.
Tudo o que é pequenino tem graça e ele ainda a tem, mas já teve mais. Dança o fandango com uma sabedoria nas passadas, que não há ali uma fora de ritmo. Habituou-se a ser centro dos ahs!, daqueles que nele vêem a mascote do Rancho Folclórico.

Do dançarino conheço-lhe os gestos, os hábitos, os gostos. Estes andam próximos da dança, do desenho e da conversa alheia. Gosta de dar fé de tudo, como diz a mãe. Mas a fé arreda-se da escola, que a dança das letras tem truques escondidos que é uma trabalheira desvendá-los. E os números?, o raio dos números até que dão as mãos uns aos outros e dançam o vira num sobe e desce que faz lembrar o Verde Gaio, mas embrulham os conceitos, arrefecem o raciocínio, obrigam a outra marcação que não a da melodia que se cantarola papagueando sem entender.

O lago deu que falar! Meteu água. A propósito dos meios aquáticos, veio o lago à baila. O nosso dançarino não sabia descrever um lago, nem por palavras nem por desenho. Estanquei. Flashes de lagos visualizados e escritos surgiram-me em catadupa. Que fez com eles?!
E do quadro preto se fez lago, com patos e o arvoredo enquadrante. À hora de sair pedi que ficasse. Se não sabia o que era um lago será que perceberia o que era essa coisa de oceano?

-João, já viste um oceano?

- Se vi não me lembro.

- Nunca foste à praia?

- Já(poucas).

- Onde tomas banho, na praia?

- Nos balneários.

[Abracei-o com os olhos. Expliquei-lhe tintim por tintim os mistérios da água no planeta( mais uma vez).]
- Percebeste João?
- Sim, professora. E sabe?, amanhã, vou aprender a desmanchar um porco mais o meu pai e o meu tio.

Por que não me inscrevi ainda no Yoga????

7 comentários:

Anónimo disse...

Esta do lago deu que falar!Se lhe perguntares o que é uma lagoa, talvez saiba. É tudo uma questão de género, ou o rapaz até é capaz de dizer que é o bairro do dr. Lagoa.
Ai, sra ministra mais piruetas do que nós fazemos, nem os artistas circenses!

Anónimo disse...

Engraçado isso...
Nos meus tempos de alfabetização eu tinha uma enorme dificuldade de compreender o tal do túmulo do soldado desconhecido... achava muito burro por conta disso e nenhuma professora sou be explicar direito, até que madrecita conseguiu, com muito jeito e paciência!
=)

sinédoque disse...

lb, a lição dada por ele ficou agendada. Irá explicar a todos esssa prática tão vulgar noutros tempos e em desuso já, mesmo por aqui. Não tem mal nenhum, antes pelo contrário...mas a sensação que tive é que não pensou noutra coisa durante todo o dia. A cultura de cada um deve ser aproveitada como forma de integração de todos na vida escolar, mas é necessário dar o salto e alargar horizontes e, por vezes, sentimos uma resistência tão grande!

sinédoque disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Olá
Eu sou o Joãzinho
Que pena eu não saber o que é um lago e pecado dos pecados nem saber o que é um oceano.
Problema de comunicação com os meus 'velhotes' ou pressuposto da minha professora que eu deveria conhecer o 'metier'
Mas para 'roidinha de inveja' da minha professora eu vou saber como se mata um porco, coisa que ela provavelmente até sabe como é e nunca nos falou do assunto, sendo um acto que faz parte da cultura da nossa terra.
Quem sabe eu não vou enriquecer este blog, descrevendo à imensidão de profs que por aqui passam, os costumes da minha terra.
Até lá...

Nilson Barcelli disse...

Nunca soube dançar e, talvez por isso (hehehe...), na escola primária eu aprendi o que era um lago (também um rio, o mar, etc.). Mas só fiquei a saber o que realmente era depois de ver um. Rio já sabia o que era, pois quando fui para a escola já sabia nadar...
Também aprendi as linhas do caminho de ferro e as estações principais (apeadeiros, não...! dizia o professor...). Mas só percebi a diferença entre apeadeiro e estação depois de andar de combóio.
O ensino, antigamente, era "a martelo". Agora nem sei como é. Mas sempre deve ser melhor que no passado.
Que bela história nos contaste. Todos os teus textos, aliás, são muito bons.
Beijinhos.

sinédoque disse...

Solidão lacustre!!!

Desabafo de professora numa sexta-feira à tarde, mas não há ninguém que a entenda!