reflexos de vida no silêncio espelhado da água. fragas de vidro em descontinuidades do olhar ...

terça-feira, setembro 19, 2006


Inside... Outside



Figura fora das grades. Eu dentro. Comigo a segurança do espaço protegido de desconhecidos e de familiares fora de horas. Meço-o à distância. Não terá mais que a minha altura.Empatados. Esguio a coluna como se um fio de cabelo me prendesse ao céu. O salto alto fará o resto. Pequenos cuidados de quem não espera pera doce. A certeza como guarda-costas, garantindo firmeza e amparo como caução.
Duas guardiãs seguem-me com o fito no telefone e olho no saco que lhe pende das mãos. Histórias conhecidas e recorrentes de violência doméstica sobre mulher e filhos e a quem lhe faça frente, exigem método e postura.
À família não dá descanso. Com humilhantes cenários de vida, vai desfibrando os ténues laços que o unem aos filhos .
Homúnculo. Corpo delgado de quem do alimento não tira proveito. Prevejo-lhe descarga biliar fazendo lavagem aos interiores revoltos que lhe prognostico, ali...à minha frente. Mas não. Primou na vestimenta e esta continua sem vestígios de inundação súbita ou escorrências de odor suspeito.
Reclama autoridade de custódias justificadamente perdidas. Reivindica justiça em sede errada para tal exigência.
Procuro-lhe os olhos de cor indefinida por entranhas de ódio e ressentimentos, na esperança de encontrar o senso que há muito perdeu, entre clínicas psiquátricas e fugas constantes à vida.
O rosto seco e ríspido revela maxilares perros de diálogo repentinamente oleados pela espuma branca que se instala na boca estiada de saliva e quase ausente de lábios.
Sinto-lhe o sofrimento.O mundo contra ele. A solidão a pingar-lhe no coração, aparada em taças que transbordam de desamor e incompreensão.
Esquizófrenia.Doença irreconhecida e negada pelo próprio. Desordem interior como sala em desalinho onde se amontotam e amarrotam emoções de uma vida madrasta. Alucinações de um exterior sempre árido de afecto.

2 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns por ter conseguido transformar um episódio triste e amargo numa prosa tão comovente.

Anónimo disse...
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