reflexos de vida no silêncio espelhado da água. fragas de vidro em descontinuidades do olhar ...

segunda-feira, abril 07, 2008




Hoje, sinto-me tranquila. Não aquela tranquilidade de quando era menina. Quando sabia que se roubasse uma rosa para oferecer à minha mãe e a dona do jardim estivesse entre portas a ver-me praticar o delito, eu correria para os braços da avó a pedir socorro e ela resolveria tudo com um sorriso e uma conversa de amigas com a vítima do furto. Não, essa tranquilidade já não a tenho. Perdi-a quando deixei de ter avó, de ter colo onde coubesse, de ter pregas no pescoço de alguém para beliscar até me ficar nuvem a pairar no sono.

“É tão bom ser pequenino, ter pai, ter mãe, ter avós, ter esp'rança no destino e ter quem goste de nós”. (Esta era uma das canções com que a minha avó me embalava)

Passei a ser eu o colo de mim e dos meus. Mas hoje roubei uma rosa. Entreguei-a a quem a merecia e não aconteceu nada, porque a roseira era brava e o dono era o chão que a viu nascer. Atei-a ao coração onde as palavras se prendiam por dentro e me enfiavam um funil na garganta. Afunilando para dentro as emoções em pacotinhos de açúcar e alargando do interior a necessidade de dar.
Não tinha mais nada à mão. Às vezes, nem uma palavra salta da boca no embaraço do momento, só o gesto fala por mim e os olhos lampejantes de palavras (sonsas!) que não encontram a coerência que pretendo.

Toma! Gosto de ti!

Nem isto sai. Mas a rosa, cheia de espinhos rasgou-me a carne dos dedos e marcou a sangue o gesto sem anemia na alma.

Hoje, roubei uma rosa, mas sinto-me tranquila.

4 comentários:

Nilson Barcelli disse...

Será caso para te dizer que continues a roubar rosas...?

Gostei do texto, é delicioso, desde logo porque falas da tua avó com um ternura imensa.

Continua tranquila, beijinhos.

Anónimo disse...

Como é possivel que uma Rosa que se rouba, mas de que se gosta nos possa rasgar a carne?
A Rosa compreenderá que o seu lugar não era no canteiro no meio de outras anónimas, mas nas mãos de alguém que cuidaria dela com mil cuidados apaixonados, e ai ela se transformará na mais doce e gentil flor

A Rosa

Anónimo disse...

eu tenho uma avó linda com 89 anos que ainda sorri todos os dias e reza por mim ;) é um tesouro! não sei o que vai ser de mim sem ela...

beijinho muito grande e uma rosa!

Anónimo disse...

Eu também gosto de ti.
Cada vez mais.

Obrigado pela rosa.
Beijo.