Chegam os dias sem despertador como adereço principal do acordar e madrugo mais cedo, sem sono. A claridade apressada, nesta altura do ano, espreita cedo os recantos do quarto, sucumbindo a sombra dos objectos conhecidos, que rapidamente se reposicionam nos lugares costumeiros, após orgia nocturna. Dia após dia vêmo-los ali na estética esquadria de um dia, longínquo, de inspiração.
Levanto-me de mansinho, para não os assustar. Dos pés saem raízes que se prendem ao núcleo central da terra, não levante eu voo etéreo na leveza dos dias.
Há muito que a passarada da vizinhança conversa numa estridente praça de jorna, regateando o melhor lugar para atacar a comida do Baltazar que dá de bandeja vida fácil a quem por aqui arranja ninho, ou pernoita nas árvores que ladeiam o quintal. Indiferente, o bicho teima com o sono, que lhe pende timidamente a língua entre dentes e a imagem de dona fora de portas tão cedo. Já são horas de passear? Levanta só a cabeça ainda com a língua entre portas. Quer perceber se é mimo nocturno ou se deixou passar a hora. Dorme Baltazar, vim só beber a frescura da manhã e um copo de leite morno.
Regresso à horizontalidade agora ainda mais acolhedora. A vela está torta, a jarra sem flores, as molduras...levanto-me e abro a janela. Hoje, vou mudar o quarto! A madrugada sempre me inspirou.
2 comentários:
Ambivalências que despertam a criatividade na sede de mudar o espaço para sentir que algo mais também mudou, o contrário também é verdade...
O Baltazar é discreto.
Gosto desta pena e da tinta que dela flui.
Um beijo
e se a graciosidade da escrita e dos gestos se aplicar assim toda e inteira na mudança .. sairá um quarto do mais acolhedor possível .. aposto ! ;)
Bons descansos .. *
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